segunda-feira, outubro 31

O que eles dizem...

ANTES de impor os generalizados sacrifícios e cortes à função pública, José Sócrates anunciou e garantiu que, como exemplo, os políticos seriam os primeiros a prescindir dos seus regimes de privilégios injustificados.

Para isso, e porque, como assegurou, «os sacrifícios teriam de ser distribuídos por todos», iria ser revista a lei das subvenções dos políticos. Uma lei que, há mais de duas décadas, permite que seja contado a dobrar o tempo em funções dos políticos para efeitos de reforma, que lhes seja atribuído um invejável subsídio de reintegração ou que se reformem antecipadamente muito antes dos 65, dos 60 ou até dos 50 anos.

O fim destes privilégios iria abranger, de imediato, mais de um milhar de autarcas (presidentes de câmara e vereadores executivos) e algumas dezenas de deputados, entre outros políticos. A nova lei entrou mesmo no Parlamento a 16 de Junho e foi votada e aprovada a 28 de Julho. Faltava apenas a votação final global que, face ao crescente clamor de protesto dos aparelhos partidários, o Parlamento meteu na gaveta e deixou para depois das férias.

Quando o Parlamento reabriu, a 15 de Setembro, Sócrates fez questão que a aprovação final da nova lei fosse votada de imediato, para afastar dúvidas e suspeições. E foi. Só que, em vez de seguir para promulgação em Belém, ficou a aboborar nos gabinetes do Parlamento e na secretária do socialista Osvaldo Castro. Só foi enviada a Jorge Sampaio a 4 de Outubro e contendo uma disposição dúbia que estipula que «a presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação». Ou seja, estava garantido que os autarcas reeleitos a 9 de Outubro podiam dormir descansados. A nova lei só teria efeitos a partir de 15 de Outubro ou mesmo de 1 de Novembro. Os vinte dias que o Parlamento reteve a lei, antes de a enviar para a Presidência, tinham sido cirurgicamente providenciais. E assistiu-se a um inédito movimento de tomadas de posse antecipadas e apressadas um pouco por todas as autarquias do país. Sócrates e o PS tinham permitido que as regalias e regimes especiais da classe política se prolongassem até 2009 e abrangessem mais umas larguíssimas centenas de políticos no activo.

Com que cara e com que moralidade podem o primeiro-ministro, o PS e os deputados em geral encarar os juízes e magistrados em greve? Ou exigir que a generalidade dos funcionários públicos compreenda as dificuldades e aceite os sacrifícios? Não sobrará, no meio de tudo isto, um mínimo de vergonha?

in jornal expresso

1 comentário:

Unknown disse...

E eles lá têm alguma vergonha?
Se tivessem vergonha não se passava metade, do que se passa no nosso país!